Editorial. As tragédias do Brasil
A corrupção sistêmica envolvendo o Estado e o setor privado desde 2003 é uma tragédia cujas consequências assombrarão os brasileiros nos próximos anos. Essa tragédia está ligada a outras como o complexo de colonizado, que culpa tudo na colonização portuguesa. A própria existência da Operação Lava Jato mostra uma mudança de mentalidade, de uma mentalidade de culpar os outros por uma ética de responsabilidade. Por causa dessas duas visões polarizadas, a sociedade brasileira está lutando uma guerra de ideias, e a resultante falta de diálogo é uma tragédia que pode transformar o Brasil em um estado falido.
Durante as campanhas eleitorais presidenciais de 2018, a sociedade brasileira se polarizou entre a direita e a esquerda. Essa polarização é um sintoma de um problema ainda mais grave, a fragmentação social do país causada pela proliferação de grupos de identidade política. Os meus dois ensaios publicados nesta edição cobrem esses tópicos. O primeiro ensaio trata da identidade brasileira e da descrição da mentalidade brasileira. O segundo ensaio aborda a polarização da sociedade brasileira, a prolongada hegemonia da esquerda e o surgimento da direita. Os dois artigos apontam o problema da falta de diálogo, sem o qual o Brasil não poderá reparar suas fraturas, encontrar seu caminho, e seguir em frente para tempos melhores.
Como se as tragédias acima não bastassem, o Brasil sofreu mais uma gigantesca tragédia no incêndio do Museu Nacional, no Rio de Janeiro, que ocorreu na noite de 3 de setembro de 2018. Fundado em 1818 por D. João VI, o Museu Nacional abrigava mais de 20 milhões de itens, incluindo documentos históricos, coleções botânicas, zoológicas e mineralógicas, antigos artefatos gregos e romanos, a maior coleção egípcia da América Latina e o mais antigo fóssil humano descoberto no atual território brasileiro, chamado ‘Luzia’. No rescaldo do incêndio, Alexandre Garcia, jornalista e radialista político de 78 anos, registrou um lamento contundente desta tragédia, cuja transcrição é disponibilizada nesta edição da PortVitoria. Também é apresentado um relato detalhado da tragédia da perda do Museu Nacional no artigo de João José Fermi.
Refletir sobre as tragédias do Brasil me fez lembrar de algumas frases idiomáticas em inglês ligadas à boa administração, como ‘Not on my watch’ e ‘The buck stops here’, e o resultado é uma aula de inglês escrita na forma de um artigo, que eu espero que alguns leitores de PortVitoria achem útil.
A única revisão nesta edição é do livro de Jordan Peterson 12 Regras para a Vida: Um antídoto para o caos (2018). Peterson é um psicólogo canadense e professor da Universidade de Toronto que ganhou notoriedade no Canadá em 2017 por sua oposição a uma emenda à Lei Canadense de Direitos Humanos (Bill C-16) acrescentando ‘identidade ou expressão de gênero’ à lista de motivos proibidos de discriminação, argumentando que isso interferiria no direito à liberdade de expressão. O livro de Peterson 12 Regras para a vida apareceu em janeiro de 2018 e em apenas algumas semanas tornou-se um best-seller em todos os países anglófonos. A edição em português apareceu no final de maio e o livro parece estar vendendo bem no Brasil. Peterson atribui o sucesso de seu livro ao fato de preencher um espaço muito necessário no mercado, mas é óbvio que a sua presença na internet, em vídeos e podcasts, também desempenhou um papel substancial. Confesso que me tornei fã de Peterson depois de assistir a alguns de seus vídeos no YouTube, tendo comprado o seu livro depois disso. As ideias de Peterson descrevem muitos dos problemas que afetam a civilização ocidental e tenho certeza de que eles podem ajudar os brasileiros a resolver suas dissonâncias cognitivas.
Joaquina Pires-O’Brien
January 2019
How to reference
Pires-O’Brien, J. Editorial. O trágico do Brasil em 2018. PortVitoria, UK, v.18, Jan-Jun, 2019. ISSN 2044-8236.